A decisão do STF na ADI 5322 e as alterações na Lei do Motorista
04/09/2023
Por Narciso Figueirôa Junior
INTRODUÇÃO - O Supremo Tribunal Federal proferiu decisão nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5322 trazendo significativas alterações na Lei 13.103/15 que regulamenta a profissão do motorista e que alterou a CLT e o CTB.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) é uma das ações especiais ajuizada diretamente no Supremo Tribunal Federal visando a declaração de inconstitucionalidade de lei, ato normativo federal ou estadual e somente pode ser proposta pelo presidente da República, pelos presidentes do Senado, da Câmara dos Deputados ou de Assembleia Legislativa, pela Ordem dos Advogados do Brasil, pelo procurador-geral da República, por partido político e por entidade sindical de âmbito nacional.
Possui previsão no artigo 102, inciso I, letra a, da Constituição Federal, na Lei 9.868/99 e no Regimento Interno do STF e há necessidade de manifestação nos autos do Advogado-geral da União e do Procurador-Geral da República.
É cabível pedido de medida cautelar, cuja concessão somente pode ser feita pela maioria absoluta dos ministros que compõem o Tribunal, ou seja, por seis votos, haja vista que o Pleno do STF é composto por onze ministros.
Em casos excepcionais e de urgência, a cautelar poderá ser deferida sem que sejam ouvidas as autoridades de quem emanou a lei e uma vez proposta a ADI, não se admite desistência.
Como regra a declaração de inconstitucionalidade passa a surtir efeitos imediatamente, a partir da publicação da certidão de julgamento conforme jurisprudência do STF, salvo disposição expressa em contrário do próprio tribunal.
Quando a decisão comprometer a segurança jurídica ou excepcional interesse social estiver em risco, o STF poderá modular os efeitos da decisão, ou seja, pode restringir os efeitos da declaração de inconstitucionalidade ou decidir que ela só tenha eficácia a partir do trânsito em julgado ou em outro momento a ser fixado, dependendo esta decisão da aprovação de 2/3 dos ministros que integram a Corte, o que se costuma chamar de modulação, conforme prevê o artigo 27 da Lei 9.868/99.
De acordo com o art.28, da lei 9.868/99, a declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal.
Feitas essas considerações iniciais analisaremos a seguir o que o STF julgou na ADI 5322 que discute a constitucionalidade de vários dispositivos da Lei 13.103/15.
A primeira Lei do Motorista foi a 12.619/12 elaborada através de um entendimento entre o segmento econômico do transporte rodoviário, trabalhadores e Ministério Público do Trabalho e trouxe inovações importantes tais como a obrigatoriedade do controle fidedigno da jornada, tempo de espera, tempo de reserva e seguro obrigatório.
Diferentemente da Lei 12.619/12 que foi negociada entre os atores sociais, a Lei 13.103/15 teve iniciativa das entidades representativas dos embarcadores do transporte rodoviário de cargas, sobretudo do agronegócio, preocupadas com um possível aumento de custo do transporte em razão das alterações trazidas pela Lei 12.619/12.
Vale lembrar que a Lei 13.103/15 revogou alguns dispositivos da Lei 12.619/12, trazendo outras inovações importantes, mas alterou sensivelmente o tempo de espera, inclusive reduzindo a sua indenização que antes era correspondente a hora mais 30% para 30% sobre a hora-normal, além de permitir que as horas do tempo de espera pudessem ser consideradas dentro da jornada e não apenas após a jornada normal de trabalho como previa a Lei 12.619/12.
A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5322
A ADI 5322 foi proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres (CNTTT), em 20/05/2015, com intuito de obter a declaração de inconstitucionalidade de vários dispositivos da Lei 13.103/15 e apenas em 15/09/2021 teve início o julgamento.
Após alguns adiamentos o julgamento foi concluído em 30/06/2023 e por maioria, prevalecendo o voto do Ministro Alexandre de Moraes, foram declarados inconstitucionais quatro temas dos vários que foram questionados na referida ADI.
Em 12/07/2023 foi publicada a certidão de julgamento o que, de acordo com a jurisprudência do STF, é suficiente para que a decisão possa surtir efeitos e, em 30/08/2023, foi publicado o acórdão, cuja ementa é a seguinte:
“EMENTA: CONSTITUCIONAL E TRABALHISTA. CLT – LEI 13.103/2015. POSSIBILIDADE DE REGULAMENTAÇÃO DO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE MOTORISTA. NECESSIDADE DE ABSOLUTO RESPEITO AOS DIREITOS SOCIAIS E ÀS NORMAS DE PROTEÇÃO AO TRABALHADOR PREVISTAS NO ARTIGO 7º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. RAZOABILIDADE NA PREVISÃO DE NORMAS DE SEGURANÇA VIÁRIA. PARCIAL PROCEDÊNCIA DA AÇÃO.
1. Compete ao Congresso Nacional regulamentar, especificamente, a profissão de motorista profissional de cargas e de passageiros, respeitando os direitos sociais e as normas de proteção ao trabalhador previstos na Constituição Federal.
2. São legítimas e razoáveis as restrições ao exercício da profissão de motorista em previsões de normas visando à segurança viária em defesa da vida e da sociedade, não violando o texto constitucional a previsão em lei da exigência de exame toxicológico.
3. Reconhecimento da autonomia das negociações coletivas (art. 7º, XXVI, da CF). Constitucionalidade da redução e/ou fracionamento do intervalo intrajornada dos motoristas profissionais, desde que ajustado em acordo ou convenção coletiva de trabalho.
4. A Constituição Federal não determinou um limite máximo de prestação em serviço extraordinário, de modo que compete à negociação coletiva de trabalho examinar a possibilidade de prorrogação da jornada da categoria por até quatro horas, em sintonia com a previsão constitucional disciplinada no art. 7º, XXVI, da CF.
5. Constitucionalidade da norma que prevê a possibilidade, excepcional e justificada, de o motorista profissional prorrogar a jornada de trabalho pelo tempo necessário até o veículo chegar a um local seguro ou ao destino.
6. O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL fixou orientação no sentido da constitucionalidade da adoção da jornada especial de 12 x 36, em regime de compensação de horários (art. 7º, XIII, da CF).
7. Não há inconstitucionalidade da norma que prevê o pagamento do motorista profissional por meio de remuneração variável, que, inclusive, possui assento constitucional, conforme disposto no inciso VII do art. 7º da Constituição Federal.
8. Compete ao Ministério do Trabalho e Emprego a regulamentação das condições de segurança, sanitárias e de conforto nos locais de espera, repouso e descanso dos motoristas profissionais de cargas e passageiros.
9. É inconstitucional o dispositivo legal que permite a redução e/ou o fracionamento dos intervalos interjornadas e do descanso semanal remunerado. Normas constitucionais de proteção da saúde do trabalhador (art. 7º, XXII, da CF).
10. Inconstitucionalidade na exclusão do tempo de trabalho efetivo do motorista profissional, quando está à disposição do empregador durante o carregamento/descarregamento de mercadorias, ou ainda durante fiscalização em barreiras fiscais ou alfandegárias, conhecido como “tempo de espera”. Impossibilidade de decote da jornada normal de trabalho e nem da jornada extraordinária, sob pena de desvirtuar a própria relação jurídica trabalhista reconhecida.
11. Inconstitucionalidade de normas da Lei 13.103/2015 ao prever hipótese de descanso de motorista com o veículo em movimento. Prejuízo ao efetivo descanso do trabalhador.
12. PARCIAL CONHECIMENTO DA AÇÃO DIRETA COM PARCIAL PROCEDÊNCIA, DECLARANDO INCONSTITUCIONAIS: (a) a expressão “sendo facultados o seu fracionamento e a coincidência com os períodos de parada obrigatória na condução do veículo estabelecida pela Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 – Código de Trânsito Brasileiro, garantidos o mínimo de 8 (oito) horas ininterruptas no primeiro período e o gozo do remanescente dentro das 16 (dezesseis) horas seguintes ao fim do primeiro período”, prevista na parte final do § 3º do art. 235-C; (b) a expressão “não sendo computadas como jornada de trabalho e nem como horas extraordinárias”, prevista na parte final do § 8º do art. 235-C; (c) a expressão “e o tempo de espera”, disposta na parte final do § 1º do art. 235-C, por arrastamento; (d) o § 9º do art. 235-C da CLT, sem efeito repristinatório; (e) a expressão “as quais não serão consideradas como parte da jornada de trabalho, ficando garantido, porém, o gozo do descanso de 8 (oito) horas ininterruptas aludido no § 3º do § 12 do art. 235-C”; (f) a expressão “usufruído no retorno do motorista à base (matriz ou filial) ou ao seu domicílio, salvo se a empresa oferecer condições adequadas para o efetivo gozo do referido repouso”, constante do caput do art.235-D; (g) o § 1º do art. 235-D; (h) o § 2º do art. 235-D; (i) o § 5º do art. 235-D; (j) o inciso III do art. 235-E, todos da CLT, com a redação dada pelo art.6º da Lei 13.103/2015; e (k) a expressão “que podem ser fracionadas, usufruídas no veículo e coincidir com os intervalos mencionados no § 1º, observadas no primeiro período 8 (oito) horas ininterruptas de descanso”, na forma como prevista no § 3º do art. 67-C do CTB, com redação dada pelo art. 7º da Lei 13.103/2015.”
TEMAS DECLARADOS CONSTITUCIONAIS
Antes de analisarmos os quatro temas declarados inconstitucionais pelo STF e que estão causando grande preocupação no mundo jurídico e empresarial, vale destacar os demais que o STF declarou constitucionais e que também são de grande relevância para o transporte rodoviário de cargas e de passageiros.
3.1. Redução do intervalo para refeição através de Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho (CLT, art.71, par.5)
A Lei 13.103/15 acrescentou o par.5º, ao artigo 71 da CLT para prever que o intervalo intrajornada estabelecido no caput poderá ser reduzido e/ou fracionado e o previsto no par.1º poderá ser fracionado, quando compreendido entre o término da primeira hora trabalhada e o início da última hora trabalhada, desde que previsto em convenção ou acordo coletivo, em razão da natureza do serviço e em virtude das condições especiais de trabalho a que estão submetidos os motoristas, cobradores, fiscalização de campo e afins nos serviços de operação de veículos rodoviários, empregados no setor de transporte coletivo de passageiros, mantida a remuneração e concedidos intervalos para descanso menores ao final de cada viagem.
Em seu voto, o ministro Alexandre de Moraes entendeu que de modo geral, os acordos e convenções coletivas de trabalho não devem sofrer interferências externas no seu conteúdo, em respeito à autonomia de vontade que os fundamenta. Declara ser excesso de paternalismo julgar inconstitucional uma norma legal que remete ao campo da autonomia privada coletiva a fixação de trabalho e emprego de determinada categoria profissional como no caso do artigo 71, par.5º, da CLT, que não afronta o artigo 7º, XXII, da CF e encontra respaldo no artigo 611-A, III, da CLT.
3.2. Exame toxicológico de larga janela de detecção (CLT, art.168, par.6º e 7º e CTB, art.148-A)
A Lei 13.103/15 deu nova redação ao art.168 do CLT, para inserir os par.6º e 7º, dispondo que serão exigidos exames toxicológicos, previamente à admissão e por ocasião do desligamento, quando se tratar de motorista profissional, assegurados o direito a contraprova em caso de resultado positivo e a confidencialidade dos resultados dos respectivos exames.
O referido exame é obrigatório para a admissão e a demissão de motorista profissional empregado, em 1 ano a partir da entrada em vigor da Lei 13.103 (art.13, II) e deverá ter janela de detecção mínima de 90 dias, específico para substâncias psicoativas que causem dependência ou, comprovadamente, comprometam a capacidade de direção, sendo possível a utilização do exame toxicológico previsto no CTB, desde que realizado nos últimos 60 dias.
A Lei 13.103/15 trouxe a obrigação do motorista empregado se submeter a exames toxicológicos com janela de detecção mínima de 90 dias e a programa de controle de uso de droga e de bebida alcoólica, instituído pelo empregador, com ampla ciência do empregado, pelo menos uma vez a cada 2 anos e 6 meses, podendo ser utilizado para esse fim o exame obrigatório previsto no CTB, desde que realizado nos últimos 60 dias (art.235-B, VII, CLT).
Vale destacar que continua a disposição legal de que a recusa do empregado em submeter-se ao teste ou ao programa de controle de uso de droga e bebida alcoólica será considerada infração disciplinar, passível de penalização nos termos da lei (art.235-B, VII, CLT).
De acordo com o STF a alteração legislativa tem por principal finalidade melhorar a segurança no trânsito o que vem ao encontro do que está previsto no par.10º do art.144 da CF inserido pela Emenda Constitucional 82/2014, que disciplina a segurança viária no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
O acórdão reconhece que os dispositivos impugnados são fruto de políticas públicas tendentes a minorar os perigos das estradas brasileiras no que diz respeito ao uso de substâncias psicoativas por parte de motoristas profissionais, que, em sua grande maioria, trafegam nas vias públicas todos os dias, exercendo uma atividade extremamente importante para a economia nacional.
Por fim, entende o STF que a exigência dos exames toxicológicos por ocasião da: a) admissão; b) desligamento; c) habilitação da CNH; d) renovação da CNH; e e) periodicamente a cada dois anos e seis meses, impõe razoável e legítima restrição ao exercício da profissão de motorista, reduzindo os riscos sociais inerentes à categoria e preservando a incolumidade de todos os usuários de vias públicas, tendo havido o cuidado de preservar a intimidade dos motoristas ao assegurar a confidencialidade do resultado do exame.
3.3. Aplicação da Lei 13.103/15 apenas ao motorista empregado TRC/TRP (CLT, 235-A)
O artigo 235-A da CLT dispõe claramente que os preceitos contidos na Seção IV-A da CLT aplicam-se tanto ao motorista do transporte rodoviário de cargas quanto ao motorista de transporte rodoviário coletivo de passageiros.
O STF entendeu que não procede a alegação de que o artigo 235-A da CLT, com a redação dada pelo art.6º da Lei 13.103/15, seria inconstitucional simplesmente por ter excluído do seu âmbito de incidência motoristas profissionais que atuam em outras áreas, pois cabe ao Poder Legislativo elencar, com base nas suas atribuições constitucionais, qual ou quais profissões mereçam receber tratamento por meio de lei, concluindo pela constitucionalidade do referido dispositivo.
3.4. Prorrogação da jornada em até 4 horas extras por Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho (CLT, 235-C, caput)
A Lei 13.103 inseriu na CLT o art.235-C para dispor que a jornada de trabalho do motorista profissional é de 8 horas diárias, admitindo-se a sua prorrogação por até 2 horas extras ou, mediante previsão em convenção ou acordo coletivo, por até 4 horas extras.
Para o STF, embora a CF determine, no art.7º, XVI, uma remuneração pelo serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinquenta por cento à hora normal, o texto constitucional não impõe um limite máximo de horas extras que podem ser realizadas pelo trabalhador, sendo que a profissão de motorista possui regramento especial em razão da própria dinâmica que envolve o transporte rodoviário de pessoas e de cargas, sendo autorizada a prestação de trabalho extraordinário até quatro horas, por intermédio de negociação coletiva.
O acórdão declara que não há afronta ao texto constitucional, pois a expressão impugnada não diz respeito ao trabalho ordinário prestado pelo motorista e sim o laborado em caráter excepcional e a Carta Magna não determinou um limite máximo de prestação de serviço extraordinário, remetendo a norma impugnada ao campo da negociação coletiva a possibilidade de prorrogação da jornada diária por até quatro diárias em conformidade com o art.7º, XXVI da CF.
3.5. Jornada de trabalho flexível (CLT, 235-C, par.13º)
O artigo 235-C, par.13, da CLT dispõe que, salvo previsão contratual, a jornada de trabalho do motorista empregado não tem horário fixo de início, de final ou de intervalos, o que consiste em alteração positiva para que fique bem esclarecido que a dinâmica da atividade profissional do motorista inviabiliza que o mesmo possa ter horário fixo de início e término de sua jornada, lembrando que os repousos e as pausas obrigatórias sempre deverão ser observados.
De acordo com o STF a Constituição Federal não definiu parâmetros quanto ao início ou término do horário de trabalho, estabelecendo apenas o padrão da jornada de trabalho, compreendido entre oito horas diárias e quarenta e quatro semanais (CF, art.7º, XIII), declarando constitucional a jornada de trabalho flexível de que trata o artigo 235.-C, par.13º da CLT.
Vale ressaltar que o STF reconhece que tanto o motorista do transporte rodoviário de passageiros ou de cargas, exerce uma atividade tipicamente dinâmica que exige por vezes uma maior flexibilidade em relação ao início e término de sua jornada diária de trabalho e por essa razão o legislador deixou a cargo do empregador, de acordo com a necessidade da atividade exercida, a definição do melhor horário para o início e término da jornada de trabalho dos motoristas empregados, devendo ser respeitados os limites legais da jornada diária de trabalho.
Dispensa do motorista do serviço, após o cumprimento da jornada normal em viagens de longas distâncias (CLT, 235-D, par.3º)
O art.235-D, par.3º da CLT estabelece que o motorista empregado, em viagem de longa distância, que ficar com o veículo parado após o cumprimento da jornada normal ou das horas extraordinárias fica dispensado do serviço, exceto se for expressamente autorizada a sua permanência junto ao veículo pelo empregador, hipótese em que o tempo será considerado de espera.
O STF entendeu que tal dispositivo não viola o art.7º, XV e XXII da CF, pois se trata de norma que versa sobre a organização da atividade econômica direcionada ao empregador, que possui a prerrogativa de estabelecer os meios para a melhor prestação de serviços.
3.7. Extrapolação da jornada pelo tempo necessário para chegada a um local seguro ou ao seu destino (CLT, art.235-D, par.6º)
A Lei 13.103/15 alterou a regra prevista na Lei 12.619/12 estabelecendo que em situações excepcionais de inobservância justificada do limite de que trata o art.235-C, devidamente registradas, e desde que não se comprometa a segurança rodoviária, a duração da jornada de trabalho do motorista profissional empregado poderá ser elevada pelo tempo necessário até o veículo chegar a um local seguro ou ao seu destino.
A referida regra já constava na Lei 12.619/12, mas no artigo 235-E par.9º, da CLT, sendo situação de força maior devidamente comprovada.
Para o STF o art.235-D, par.6º, da CLT não possui inconstitucionalidade, pois apenas prevê uma possibilidade, excepcional e justificada, de o motorista profissional prorrogar a jornada de trabalho pelo tempo necessário até o veículo chegar a um local seguro ou ao destino, sendo que o texto legal condiciona a excepcional prorrogação da jornada normal ao respeito das normas de segurança rodoviária.
Vale lembrar que a situação excepcional prevista no referido dispositivo legal deve ser devidamente registrada no controle de horário e acarreta a obrigação de pagamento de horas extras ao motorista profissional em razão da prorrogação da jornada normal de trabalho.
3.8. Intervalo de repouso diário nos casos em que o motorista tenha que acompanhar o veículo embarcado (CLT, 235-D, par.7º)
A lei 13.103/15 trouxe um novo disciplinamento para os casos em que o motorista tenha que acompanhar o veículo transportado por qualquer meio onde ele siga embarcado e em que o veículo disponha de cabine leito ou a embarcação disponha de alojamento para gozo do intervalo de repouso diário previsto no par.3º, do artigo 235-C (11 hs de descanso), considerando esse tempo como de descanso (art.235-D, par.7º, CLT).
O STF afastou o pedido de inconstitucionalidade do referido dispositivo aduzindo que a situação não se confunde com o tempo de prontidão de que trata o art.244, par.3º, da CLT, pois a norma impugnada tratou de tempo de descanso, institutos que não se confundem, sendo que no referido período o motorista não fica aguardando ordens do empregador, não se enquadrando como jornada de trabalho.
Além disso, o acórdão destaca que o legislador condicionou tal fruição do tempo de descanso em local onde o veículo siga embarcado à existência no veículo de cabine-leito ou que a embarcação disponha de alojamento para gozo do intervalo de repouso diário.
3.9. Condições de trabalho específicas para o transporte de cargas vivas, perecíveis e especiais em longas distâncias ou no exterior (CLT, 235-D, par.8º)
O artigo 235-C, par.8º, da CLT, com a redação trazida pela lei 13.103/15 estabelece que, para o transporte de cargas vivas, perecíveis e especiais em longa distância ou em território estrangeiro poderão ser aplicadas regras conforme a especificidade da operação de transporte realizada, cujas condições de trabalho serão fixadas em convenção ou acordo coletivo de modo a assegurar as adequadas condições de viagem e entrega ao destino final.
Trata-se de importante previsão legal para que se possa adequar a legislação às necessidades específicas do transporte de cargas vivas e perecíveis.
Prevaleceu no STF o entendimento de que o referido dispositivo é constitucional, pois permite que, dada a especificidade da atividade de transporte de cargas vivas, perecíveis e especiais em viagens de longas distâncias ou em território estrangeiro, as condições de trabalho sejam ajustadas através de norma coletiva (ACT ou CCT), sem que haja a exclusão das normas gerais celetistas, possuindo caráter complementar que possibilita aos sindicatos interessados adequarem as melhores condições de trabalho conforme a necessidade da atividade, estando a norma em conformidade com o art.7º, XXVI, da CF.
3.10. Jornada de 12 X 36 através de Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho (CLT, art.235-F)
A Lei 13.103/15 permite que seja estabelecida a jornada de 12 horas por 36 horas de descanso, mas fez uma pequena alteração na redação anterior trazida pela Lei 12.619/12.
De acordo com o artigo 235-F da CLT, convenção e acordo coletivo poderão prever jornada especial de 12 horas por 36 horas de descanso para o trabalho do motorista profissional empregado em regime de compensação.
Não ficou muito clara a menção ao “regime de compensação” e foi excluída a expressão contida na redação anterior que autorizava a implantação do referido regime de 12X36 “em razão da especificidade do transporte, de sazonalidade ou de características que o justifique.”
Todavia, entendemos que na prática a alteração não foi substancial e tal regime pode ser útil em alguns segmentos específicos de transporte rodoviário de cargas, mas a sua aplicabilidade sempre dependerá de negociação coletiva.
Vale destacar que as Leis 12.619/12 e 13.103/15 foram as primeiras a inserir na CLT a jornada de 12X36 que antes das referidas normas era considerada válida em razão da Súmula 444 do TST, desde que em caráter excepcional, se houvesse previsão em lei ou ajustada em negociação coletiva.
Com a publicação da Lei 13.467/17 houve alteração na CLT para a inclusão do art.59-A que autoriza a adoção da jornada de 12X36, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, observados ou indenizados os intervalos para repouso e alimentação, sendo que tal regra foi declarada constitucional pelo STF no julgamento das ADI 4842 e 5994.
No que pertine ao artigo 235-F da CLT, o STF entendeu ser constitucional a referida regra, pois o art.7º, XXII da Carta Magna estabelece que a jornada normal de trabalho tem duração não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultando a compensação de horários, dando margem ao legislador ordinário para prever jornada de trabalho diferenciada, como é o caso do regime de12X36.
3.11. Remuneração variável através de comissões observada a segurança (CLT, 235-G)
A remuneração variável passou a ser autorizada pela Lei 13.103/15, sendo possível através da distância percorrida, tempo de viagem ou da natureza e quantidade de produtos transportados, inclusive mediante oferta de comissão ou qualquer outro tipo de vantagem, desde que essa remuneração ou comissionamento não comprometa a segurança da rodovia e da coletividade ou possibilite a violação das normas previstas na referida Lei (art.235-G, CLT).
Foi uma alteração significativa em relação à vedação anterior trazida pela Lei 12.619/12, sendo que a nova redação não relegou ao oblívio a circunstância de que o pagamento através de remuneração variável é muito comum no segmento econômico do transporte rodoviário de cargas, mas o fato de se condicionar a sua validade ao não comprometimento da segurança rodoviária e da coletividade indica que os repousos e pausas obrigatórias devem ser rigorosamente observados.
Para o STF não há inconstitucionalidade da norma por possibilitar o pagamento do motorista profissional por meio de remuneração variável, pois encontra respaldo no inciso VII do art.7º da Constituição Federal que prevê a “garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável”.
Além disso, o acórdão entende equivocado o raciocínio exposto na petição